O telefone tocou, olhou de lado para ele, pois habitualmente seria mais uma chamada de algum call center, para mais um inquérito sem sentido ou para uma tentativa de vender algo que não queria nem precisava, deixou tocar, não reconhecia o numero, mas aquele som insistente não o deixava em paz, la teria de atender, já preparava a desculpa, quando uma voz, que não lhe era estranha disse “olá, estas bem? cheguei hoje, e lembrei-me de te ligar, saudades, talvez”, assim sem muitos floreados ou palavras gastas ou de circunstância, como ele gostava. A conversa fluía, e ele ia-se lembrando-se daquele rosto há tanto tempo perdido, daquela voz que tinha partido á tantos anos. Marcou-se um jantar, talvez um copo num desses bares da cidade, tudo dependia do reencontro, não valia a pena fazer planos, havia tantos anos que não se viam, as pessoas mudam, como ele ultimamente tinha sentido na pele e na alma, quem seria agora aquela “estranha” com que ia jantar? Vestiu-se como sempre, de forma casual, gostava de agradar, mas sabia que se não se sentisse bem consigo, dificilmente poderia agradar, há anos que tinha descoberto isso, quando mudava vezes e vezes de roupa, para depois vestir sempre o que mais gostava, o que mais o deixava confortável, sempre que tinha feito o contrario, tinha sido um desastre, não estava a vontade e isso sentia-se. Saiu para a rua, fechou a porta e caminhou pelas ruas cheias de gente, que saiam do trabalho em direção as suas vidas marcadas, pelos horários e pelos compromissos, absortos em pensamentos, sem olharem a sua volta, rostos fechados e ausentes. Ansiava por ver um rosto diferente, alguém com um sorriso, e la estava ele, naquele rosto que agora se completava na sua mente, há tantos anos perdido que quase já não passava de uma névoa perdida, mas bastou o sorriso para que tudo se tornasse nítido e claro. Um abraço há tanto desejado, um beijo demorado e tudo se tornou tão simples como se fosse ontem a ultima vez que se tinham visto. Veio o jantar e uma emoção de palavras de historias de sensações de imagens e de recordações, de vidas atualizadas . Saiu para a rua, de mão dada e com a cumplicidade do sorriso de ambos, quis ir ao bar que era o “deles”, mas tinha fechado, nem ele tinha dado por isso, mesmo vivendo por cá, não importava, outro bar os esperava, esta noite não era de saudosismo ou pieguices, era a noite de celebrar a vida, não o que tinha sido perdido ou deixado para trás, mas sim o presente o momento. Tinha já nascido o dia quando o seu corpo encostado ao dela, nus naquele quarto, depois de uma noite em que os sonhos se tinham unido a realidade, em que o seus olhares se cruzaram para sem uma palavra saberem que o quarto ocupado, até ai por ele nunca mais seria só seu.
J.C.